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O celular não tem culpa

Confira, abaixo, o artigo do jornalista e promotor de Justiça aposentado Cláudio Brito, publicado no Jornal Zero Hora desta segunda-feira (10/7). Brito também é assessor de comunicação social da AMP/RS.
10/07/2006 Atualizada em 21/07/2023 10:57:15
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Confira, abaixo, o artigo do jornalista e promotor de Justiça aposentado Cláudio Brito, publicado no Jornal Zero Hora desta segunda-feira (10/7). Brito também é assessor de comunicação social da AMP/RS.


Quando os presos políticos foram para o presídio da Ilha Grande, no Rio de Janeiro, depois de 1964, adaptaram-se para sobreviver entre criminosos comuns. Se os mais perigosos estavam naquele casarão de isolamento, era terrível saber que intelectuais, estudantes e idealistas que a ditadura prendia estavam ameaçados de tortura e morte duas vezes. Nas sessões de espancamento e interrogatórios em quartéis e delegacias e, depois, na cadeia, com a bandidagem.


Para driblarem a selvageria, agiram com inteligência. Provocaram os presidiários a que se organizassem, ensinaram-lhes a enxergar que, em liberdade, deveriam cuidar dos interesses dos que continuavam recolhidos. Estabeleceram meios de comunicação com o mundo da rua, fosse por cartas em linguagem cifrada, recados por familiares e advogados, ou pela corrupção de carcereiros, talvez o jeito mais antigo de um preso alcançar privilégios.


E começaram assaltos e seqüestros a sustentar familiares e defensores dos condenados. O que roubavam alimentava a organização. Armas, automóveis e barcos foram se acumulando. De forma bem controlada e contabilizada, o dinheiro ainda subia o morro para proteger a favela.


Encurtando a história: nasceu o Comando Vermelho, a primeira das grandes facções criminosas a dominar as galerias das prisões brasileiras. O nome era uma homenagem dos bandidos aos moços inteligentes que lhes ensinaram as táticas e manobras que passaram a usar em seus ataques pelas ruas do Rio.


E não havia telefone celular.


Sinal de fumaça, toque de tambor, conversa codificada. Sempre houve uma forma de os presos mandarem e receberem recados. Bilhete em garrafa jogada ao mar também já valeu. O meio se altera, os objetivos nunca mudaram. O que sempre foi igual, em qualquer lugar, em qualquer época: a corrupção. De pessoas ou do sistema. O problema não está em um celular encontrado na penitenciária. O que nos deve preocupar é a soma de fatores e circunstâncias que permitiram que ele entrasse lá. Se uma visita levou um aparelho escondido no corpo, ou falharam os mecanismos de controle ou alguém facilitou a empreitada, o que ainda é pior. Sou favorável a que se impeça que apenados continuem a cometer crimes que se organizam dentro das celas que só deveriam servir de cenário ao cumprimento justo das penas. Mas não me engano. Se todos os celulares forem retirados ou bloqueados, ainda assim haverá crimes comandados por presidiários reclusos.



 


 

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