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Crianças dependentes de crack lutam por internação - Diário Gaúcho

No Rio Grande do Sul, onde cerca de 200 mil gaúchos são usuários de crack e não existem estimativas sobre quantos destes têm menos de 12 anos, o único local que disponibiliza, pelo Sus, uma ala para tratar crianças viciadas na pedra é o Hospital Psiquiátrico São Pedro (HPSP). Mas são apenas dez leitos. Conseguir um deles é uma difícil loteria, que depende, muitas vezes, da Justiça.
31/05/2010 Atualizada em 21/07/2023 11:01:05
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Conseguir leito é loteria para a geração de zumbis

No Rio Grande do Sul, onde cerca de 200 mil gaúchos são usuários de crack e não existem estimativas sobre quantos destes têm menos de 12 anos, o único local que disponibiliza, pelo Sus, uma ala para tratar crianças viciadas na pedra é o Hospital Psiquiátrico São Pedro (HPSP). Mas são apenas dez leitos. Conseguir um deles é uma difícil loteria, que depende, muitas vezes, da Justiça. Em Montenegro, um retiro que mantém uma unidade para pré-adolescentes e adolescentes já recebeu um menino de dez anos, após um apelo da própria mãe do garoto.





Hoje, na segunda matéria sobre a geração de zumbis que está se formando devido ao crack, o Diário Gaúcho mostra como estes dois locais trabalham para tentar livrar os pequenos usuários da pedra maldita.

 

Metade dos leitos para craqueiros



O corredor de paredes brancas, com desenhos a tinta guache, lembra uma escola. A sala de convivência, com cortinas coloridas e brinquedos, um quarto infantil.



A decoração é parte da tentativa do HPSP de alegrar a sombria vida dos pequenos. O São Pedro mantém o Centro Integrado de Atenção Psicossocial (Ciaps) Infantil. No local, que atende a internos entre cinco e 11 anos, pelo menos 50% dos dez leitos são ocupados por vítimas da pedra.



– O número de crianças envolvidas por esta droga vem aumentando nos últimos cinco anos. A maioria tem pais usuários de drogas ou ausentes – constata o psiquiatra Ronaldo Rosa.



Sob os cuidados de enfermeiros e médicos, chamados de tios, as crianças têm atividades como musicoterapia e educação física. O dia mais esperado é a quarta-feira, com um projeto da Ufrgs que oferece aulas de Informática. Há até um blog (http:\\oficinandoemrede.blogspot.com).



No total, o tratamento no HPSP dura três semanas:



– O tempo é curto, mas tentamos descobrir quais são os problemas destes internos.



A Secretaria Estadual da Saúde informou que conta com 617 leitos no Estado para tratamento de drogados. Mas não especifica quantos são para crianças.



- Quero ter uma vida nova"



Aos 15 anos, uma garota do Interior paulista passou pela segunda vez no HPSP. Usuária de drogas desde os dez, ela engravidou aos 12 e doou o bebê para seguir no crack. Percorreu o Brasil na carona de caminhoneiros. Para ter a droga, se prostituía. Agora, está grávida pela segunda vez e voltou para São Paulo, após 15 dias no São Pedro:



– Meu organismo está limpo. Não vou trocar o meu filho novamente pelo crack. Quero ter uma vida nova.



Números



- A unidade de desintoxicação para adultos tem 30 leitos, todos usados por craqueiros



- A unidade de adolescentes tem dez leitos, em média, 90% são para viciados na pedra



- A ala infantil tem DEZ LEITOS, em média, 50% são para dependentes de crack





Olhar distante

Dois dias após ser internado no São Pedro, o menino de dez anos, cuja história foi publicada ontem, queria se enturmar. De pouca conversa, mais gesticulava do que falava com um garoto da mesma idade – também usuário de crack – enquanto brincavam. Cabisbaixo, não quis conversa com a enfermeira. Manteve-se calado, e distante.



Na sala de informática, esboçou o primeiro sorriso. Orientado pelos instrutores, preferiu brincar nos jogos.



– Ele chegou arredio, como todos. Mas está voltando a ser criança – afirmou a técnica em Enfermagem Fernanda Veçossi.



"Eles só querem carinho e atenção"



Há três anos lidando diretamente com os internos do HPSP, Fernanda já conhece as técnicas usadas pelos pequenos viciados.



– Os meninos chegam demonstrando malandragem e gostam de afirmar que não precisam de ajuda. Mas bastam as primeiras conversas para que eles voltem a ser apenas crianças – conta.



Fernanda costuma ouvir histórias de abandono, de famílias desgarradas e de agressões:



– Aqui eles têm comida, alguém para ouvi-los e uma rotina que não existe lá fora. Eles só querem carinho e atenção. Afinal, são apenas crianças.



Crack domina no Recreio



Trabalhando há duas décadas na recuperação de dependentes, Otávio dos Santos Furtado mantém três unidades do Retiro Comunitário de Reabilitação Ocupacional (Recreo), em Montenegro. A dos adolescentes surgiu a partir do crescimento da procura por internação para usuários a partir dos 12 anos.



Porém, Otávio alerta para outra mudança: o aumento da procura por vagas para crianças.



– Na primeira vez que veio um menino de dez anos, precisei colocá-lo com as mulheres. Eu não tinha experiência, mas não podia negar o atendimento – diz Otávio.



Hoje, os 18 internos da unidade jovem são dependentes de crack – o mais novo tem 12 anos. A maioria conheceu a pedra antes de entrar na puberdade. A internação dura nove meses.



– O tratamento das crianças é diferente. É preciso dar amor, carinho e educação. Não termina em nove meses. A sociedade não se deu conta de que, com uma criança, precisa ser diferente – avisa Otávio.



- Por que isso está acontecendo?



Entender como crianças que mal sabem ler ou escrever já estão viciadas é o desafio.



– Famílias desestruturadas, mães e pais também dependentes. Esse é o exemplo que eles têm em casa – aponta a conselheira tutelar da Capital Salete Alminhana.



Para a também conselheira Eliane Aliano, de Viamão, em geral, nesses casos, o primeiro contato com a droga acontece em casa:



– Uma vez presenciei uma cena de um menino que sangrava há dois dias. Em vez de levá-lo ao médico, a família dava pedras para ele fumar.



Outra conselheira ressalta que, com o avanço do crack, o trabalho deles ficou mais perigoso:



– A gente entra na vila para buscar um cliente ou um soldadinho do tráfico – conta, sem revelar o nome por medo.



Fiquei doido"



O corpo franzino lembra o de um menino de oito anos, mas o morador do Litoral Norte tem 12, um vocabulário repleto de gírias e a experiência de vida de um adulto. Há dois anos, ao ver a mãe consumir drogas após a morte de outro filho, o garoto decidiu “curtir”, como ele define:



– Pensava comigo que se a minha mãe estava nas drogas, também poderia curtir uma vida mais desnaturada.



Ele demora a dizer que já usou crack, mas acaba confessando a primeira vez:



– A mãe esqueceu uma pedra. Então, experimentei. Fiquei doido.



Na visita mais recente à família, o menino convenceu a mãe a se internar. Hoje, ambos estão na Recreo. Porém, o menino deve sair nos próximos dias:



– Não sei se não vou usar de novo. Vou ver.



- "Aprendi o que é sentimento”



Aos nove anos, um dos internos do Recreo conheceu a maconha. Aos 11 anos, serviu como mula para levar 1,5kg da droga de uma cidade a outra. No mesmo ano, descobriu o crack.



Filho de pai alcoólatra, ele levou a família a mudar de cidade na tentativa de livrá-lo das drogas. Foi em vão. Em poucos dias, voltou a usar e roubava para sustentar o vício. Hoje, aos 15 anos, o garoto lembra que parou de estudar aos dez anos.



– Uma vez, fumei crack e tentei ver televisão. Não deu certo. Eu olhava e não entendia nada de tão doidão que eu estava.



Falta de serviço especializado dificulta



A principal reclamação de quem lida com as crianças é a ineficácia do tratamento. Depois dos 20 dias no hospital, a criança volta para casa e, quase sempre, para o vício.



– Em um dos casos que eu atendo, o menino foi internado três vezes em dois meses – diz Salete.



Segundo a promotora da Infância e Juventude da Capital Noara Lisboa, outra dificuldade aparece após a alta. O ideal seria a criação de Centros de Atenção Psicossocial Infantil.



– O único que temos não atende a viciados. A criação de unidades assim e que prestem atendimento à família é essencial – comenta Noara.



A consequência dessa falta de sequência é avassaladora. Sem acompanhamento, a chance das crianças recaírem é imensa.



– Sem falar no aumento do número de crimes, na superlotação dos abrigos, na evasão escolar, entre outros problemas – enumera a promotora da Infância e Juventude de Viamão, Daniela da Silva.



A exceção virou regra



Para o chefe do Serviço de Psiquiatria do HPSP, Alceu Correia Filho, mandar o paciente para casa, na chamada internação domiciliar, é uma medida paliativa.



– O tratamento em casa é feito com medicamentos para controlar a impulsividade causada pela fissura – conta.



Segundo o psiquiatra, o médico deve observar se a família tem como manter a criança em casa durante o período e vigiá-la 24 horas por dia.



– O que era para ser a exceção acaba virando regra, pois não temos leitos para todos.



Fonte: Jornal Diário Gaúcho e site Crack, nem pensar


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